O nosso amor faz-se no vão de escada... faz-se na sombra da lua... por entre a luz parda dos candeeiros de rua... o nosso amor faz-se entre duas canecas de chá quente no frio do inverno e dum copo de água quente do calor estonteante de Agosto...
Os teus passos rua acima, fazendo gemer as pedras da calçada, fazem estremecer o meu coração...
Está na hora de ir levar o lixo à rua, apresso-me, calço os chinelos, agarro no chaile...
Discretamente, em passo acelarado desço as escadas, ainda não chegaste à minha porta... pelo canto do olho vejo-te sorrir de mansinho...
"BOA NOITE MINHA SENHORA" dizes-me tu.... Ah... e eu suspiro por ouvir mais uma vez a tua voz... adocicada a mel.... Ah... o coração acelera o compasso... a música começa a tocar na minha cabeça, doce, suave...embalando-me....
Tenho um rasgo de luz... alguém espreita.... mantenho a compostura... respondo-te... quando o que queria na verdade era saltar-te nos braços e dizer-te o que sinto...
"BOA NOITE CAVALHEIRO"
Agora o olhar desnorteado é teu... imaginas longas noites a dançar ao luar, ouvindo violinos a tocar uma bela melodia apaixonada... eu de vestido comprido e luvas pelo cotovelo, tu de smoking e rosa na lapela.... Agora tocam um tango... juntaram-se mais instrumentos... a rosa a rosa.... a rosa vermelha na tua boca, na minha boca....
Fecha-se um estore, acordas do teu devaneio...
De novo no escuro da rua sob o olhar atento, agora, apenas da lua, aproximas-te de mim... estremeço... sussuras-me ao ouvido... em resposta sussurante tento esconder as saudades que tenho, o desejo de te tocar...
"NÃO VENHO TARDE"...
"ESPERAR-TE-EI ATÉ O AMANHECER...."
"TRAREI CROISSANTS"
"TEREI O CHÁ PRONTO"
E nesta breve troca de palavras as badaladas tocam no sino da igreja...o vento da noite levanta-se um pouquinho, um arrepio enrrigesse os meus músculos... é hora de voltar para dentro...
Ainda bastante perto, de modo a que ninguém possa ouvir e, tocando-me na mão, suavemente como a pluma que viaja na brisa da manhã, dizes-me baixinho:
"BOA NOITE PRINCESA..."
"BOA NOITE MEU PRINCIPE..."
E, já de dentro da portade vidro, vejo-te afastar, continuar a subir a rua até à esquina...olhas para trás... como que para recordares eternamente aquele momento que acabaste de viver...
Subo a escada, tranco a porta atrás de mim... na televisão dois amantes trocam juras de amor eterno... e eu penso em ti enquanto me sento do cadeirão, e adormeço à tua espera...